Acerca dos efeitos das plataformas vibratórias (PV) na força serei breve e começarei pelas questões mais óbvias: porque traria melhorias na força o treino numa superfície altamente instável como esta? Porque julgaríamos que vibrar o corpo todo como um "terramoto" faria o sujeito produzir mais força? A ser verdade, seria uma violação dos princípios mais básicos da fisiologia neuro-motora: quanto maior a instabilidade, menor a produção de força e menor a atividade neural relativa nos músculos atingidos (1,2). Aliás, a vibração de corpo inteiro está muito pouco estudada, mas tem sido evidente, desde os anos 70, que a vibração muscular pode desregular os receptores aferentes, causar ilusão de movimento e posição, levando a alterações posturais e a uma depressão pós-ativação - perda de força aguda (3). Devo acrescentar ainda que, se treino funcional requer a preparação do cliente para melhor lidar com o seu contexto diário, então qualquer situação instável não se enquadra nesta especificidade (2) - as PV oferecem um contexto raro no nosso dia-a-dia. Em boa verdade, uma cuidada análise revela que uma "simples" máquina de musculação será muito mais específica, pois que lidamos com o levantamento de massa em pontos de suporte estável. Mas o argumento dos defensores destes gadgets será que "quando usamos as PV estamos a fazer exercícios também com levantamento de massa (halteres ou peso corporal, por exemplo)". Sim! mas então teremos de comparar os mesmo exercícios executados com PV e SEM PV. Vejamos o que nos diz a ciência:
ATENÇÃO: só considerei artigos de revisão que fizeram questão de comparar o treino em PV com um grupo de controlo que também fazia exercícios idênticos SEM PV - é indiscutível que o exercício com PV seja melhor que nada fazer, principalmente em sedentários (estes já ganham força só de passar o torniquete do ginásio). Portanto, estudos onde o grupo de controlo ficou sentado a ver os outros treinar de nada valem para esta análise.
Até 2011 a literatura era escassa e fundamentalmente apontava para não haver benefícios adicionais em executar o treino com PV (4) - no entanto já se vendiam estes aparelhos como brócolos a vegetarianos. De facto, numa revisão sistemática (5) ficou concluído que, além de existirem somente 5 estudos com desenho metodológico adequado, em 4 deles o uso de PV foi irrelevante. Em 2015 outra revisão foi elaborada (6), desta vez observados os efeitos agudos e crónicos da vibração no desempenho de atletas (incluindo a força e potência) em 21 estudos. Os autores concluíram que os benefícios são muito reduzidos, a ponto de recomendarem simplesmente o treino com resistências SEM PV para a melhoria do desempenho. Nota: Fisher (2011) ainda deixou em aberto que haveria a possibilidade da melhor sistematização do tipo de vibração, amplitude e frequência trazerem alguns benefícios (nomeadamente vibração vertical, frequências mais elevadas e amplitudes maiores). Mas, apesar disso, a citada revisão (6) incluiu estudos também com a "supra-sumo" das plataformas (PowerPlate), frequências entre os 25-45Hz e amplitudes entre os 0,8-8mm, o que pode indicar que nem assim os benefícios são maiores que o habitual: reduzidos.
Já recentemente, Rosenberger e col. (2017),compararam os efeitos crónicos na força e no salto entre exercícios de agachamento e flexão plantar, com PV e SEM PV. Os autores concluirem que o treino em PV poderá ser benéfico (7). Conclusão precipitada, porque os resultados do seu próprio estudo mostram melhorias médias que rondaram os 7% no treino SEM PV contra 5% com PV (sem diferenças significativas entre grupos) - os próprios autores referem que "a força isométrica da extensão do joelho e a altura do salto aumentou igualmente em ambos os grupos" (7). A conclusão de uma eventual superioridade do treino com PV, foi suportada pelo facto da força da flexão plantar só ter melhorado no grupo que treinou com PV. Contudo, quem executou os exercícios com PV teve a instrução de "deslocar o seu peso total para o ante-pé o mais possível" de forma a amortecer a propagação de vibração para a cabeça - instrução esta que coloca mais torque de resistência no tornozelo no grupo de indivíduos que treinaram com PV. Uma vez que aos outros esta instrução não foi dada, sob pretexto de não causar mais variabilidade no exercício, com diferentes instruções é que houve mais variabilidade (um grande erro metodológico). Não há plausibilidade na justificação para a qual as instruções foram diferentes, e os próprios autores confirmam isto na secção da discussão: "...os seus músculos flexores plantares foram mais carregados do que no exercício com agachamento normal" (7). Portanto, e resumindo esta investigação, não houve diferença alguma entre exercício com PV ou SEM PV. Na verdade até poderíamos assumir uma ligeira tendência estatística (i.e. percentual) para a superioridade do treino SEM PV, e (isto com certeza absoluta) um grande enviesamento por parte dos autores na redação das suas conclusões.
Conclusão:
O treino com PV, além de não configurar especificidade por si só - pois a instabilidade na superfície de contacto é rara no nosso contexto diário - não confere benefícios adicionais na força quando comparado com o treino SEM PV.
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Referências:
(1) Behm e col., 2015: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26359066 (2) Wirth e col., 2016: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27475953 (3) Proske e Gandevia, 2012: https://www.researchgate.net/publication/232278003 (4) Fisher e col., 2011: https://www.researchgate.net/publication/228830087 (5) Nordlund e Thorstenssen, 2007: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17038159 (6) Hortobágyi e col., 2015: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4503864/ 7) Rosenberger e col., 2017: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28574410
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