O agachamento será, provavelmente, o exercício mais conhecido e realizado por praticantes de ginásio em todo o mundo. Pela sua natureza e versatilidade, pode ser realizado quer somente com o peso do corpo, quer com uma variedade enorme de equipamentos: halteres, barra (de diversos formatos), máquina, TRX, elástico, polia, entre outros.
Também são vários os tipos de execução utilizados para exercitar os seus principais agonistas (extensores da anca, extensores do joelho e extensores da coluna), podendo ser dado mais ênfase a uns ou a outros, ou ainda a equilibrar o trabalho a ser realizado por ambos de forma equitativa. Tudo isto, em função das características particulares do executante. Aqui, surge o Sissy Squat, uma variação que pode ser executada num banco próprio (fig. 1) – onde a sua execução se assemelha ao agachamento realizado na multipower –, ou sem o mesmo, neste caso, utilizando somente o peso do corpo ou halteres (fig. 2).
Fig. 1: Sissy squat realizado no banco
Fig. 2: Sissy squat realizado com halteres
Contudo, apesar de podermos realizar agachamento de múltiplas formas e com recurso a diversos equipamentos, o seu padrão motor mantém-se: flexão da anca e flexão do joelho na fase descendente e extensão de ambas as articulações na fase ascendente. A coluna permanece estática, devido à ação isométrica dos seus extensores (que poderão sofrer mais ou menos torque consoante o ponto de aplicação da resistência). Ao visualizarmos as imagens acima, podemos facilmente notar que tal não acontece na figura 2, onde acontece uma extensão da anca aquando da flexão do joelho na fase descendente e o inverso na fase ascendente. Para uma melhor compreensão destas diferenças, a tabela 1 expõe as diferenças ao nível dos agonistas nas várias articulações envolvidas aquando da execução de agachamento com halteres, na multipower, agachamento sissy no banco e com halteres.
Tabela 1: ação agonista aquando da fase ascendente dos movimentos – agachamento com halteres, na multipower, sissy no banco e com halteres –, nas articulações da coluna, anca e joelho.
Assim, fica claro que o sissy squat no banco é, de facto, uma variação de agachamento, aproximando-se da execução realizada na multipower, ou seja, com maior ênfase nos extensores da anca e nos extensores do joelho; enquanto que o sissy com halteres é um exercício distinto de todas as restantes versões.
E qual a importância que daí advém? Qual a relevância do nome dado ao exercício? Antes de mais, importa clarificar que a nomenclatura e a correta definição das coisas são critérios fundamentais na nossa profissão (aliás, na nossa vida), pois somente com conceitos bem definidos é que podemos abordar qualquer assunto e, dessa forma, atuar em consonância.
Ora, ao manter a designação de “squat”, facilmente haverá a tendência por parte do aluno (e, quiçá, do próprio profissional de Exercício Físico) a usar este tipo de execução como uma alternativa ao padrão de movimento inicialmente pretendido, ou seja, ao agachamento.
Façamos agora uma pausa e analisemos dois outros exercícios – Peso Morto (PM) e Bom Dia (BD) (nas suas execuções com recurso a barra), uma vez mais através dos movimentos que acontecem nas várias articulações (tabela 2):
Tabela 2: ação agonista aquando da fase ascendente dos movimentos – peso morto e bom dia –, nas articulações da coluna, anca e joelho.
Aqui, consideramos PM e BD como exercícios diferentes, pois, apesar do padrão de movimento ser bastante idêntico, este último tem uma maior incidência nas articulações desafiadas pela carga (especialmente na coluna), ou seja, pelo “simples” facto do braço de momento da resistência (distância perpendicular entre a linha de força da resistência e o eixo articular) ser maior, possuem nomenclaturas diferentes. Já no que se refere ao Peso Morto, temos designações adicionais para as suas versões “Stiffed Leg” e “Romanian”, fazendo referência “apenas” à extensão ou não (respetivamente) dos joelhos – aqui nota-se uma congruência na nomenclatura, onde o exercício em si é bastante idêntico, apenas diferindo num “pormenor”, o qual, apesar de obviamente ter a sua influência no exercício, não o transforma num exercício completamente distinto.
Voltando à distinção entre PM e BD, ainda bem que estes possuem designações diferentes, as quais remetem para serem exercícios distintos, caso contrário, poderiam ser considerados como exercícios equivalentes ou, pior ainda, sequenciais em termos de progressão do treino. Não me quer parecer (pese embora seja apenas e só a minha convicção – vale o que vale) que esta nomenclatura diferenciada seja puramente devido ao facto do equipamento (barra) ser colocado em zonas distintas no corpo do praticante, caso contrário seria apenas outra versão de Peso Morto (como as duas versões acima referenciadas). Da mesma forma, temos vários posicionamentos da carga usada como resistência ao nível do agachamento com barra, halteres, sumo, na parede, etc., mas tal não implica que seja um exercício distinto, mas apenas uma versão diferente do mesmo, uma vez que a sua essência, o seu padrão de movimento, é o mesmo (ou muito semelhante).
Concluindo, o Sissy com halteres será um ótimo exercício, caso o objetivo seja estimular os respetivos agonistas, mas, de facto, não deveria ser considerado um agachamento, na medida que:
Na sua execução com halteres, o padrão de movimento é oposto ao nível da anca e coluna, relativamente a qualquer variação do agachamento;
Já constatamos que existem exemplos na nossa área onde a nomenclatura difere entre exercícios com padrões de movimento semelhantes, devido à sua incidência diferenciada nas articulações envolvidas.
Posto tudo isto, fará sentido continuar a chamar ao Sissy com halteres de “squat”?
© David Costa, 2020
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