O exercício físico passou a fazer parte da vida das pessoas que se preocupam com a sua saúde, no entanto é ainda entendido por muitos como estando contra-indicado nos doentes com cancro. Após anos de investigação científica, surge agora a possibilidade do exercício atenuar e/ou reverter os efeitos secundários dos tratamentos e ajudar o organismo a lutar contra esta doença. Mas porque continua a ser este um tema pouco divulgado?
Começo, então, pelos efeitos dos tratamentos convencionais, que apesar de criados para destruir células doentes provocam com frequência fadiga extrema, com sensação de cansaço constante, alterações da sensibilidade e funções motoras dos nervos periféricos, “desorientam” o sistema imunitário, podendo atacar as próprias células saudáveis. Podemos dizer que como efeito secundário desencadeiam um estado de inflamação generalizada no corpo do paciente. Por outro lado, o nosso corpo tem uma capacidade natural de lutar contra o cancro através de várias substâncias produzidas pelas nossas células, como o Factor de Necrose Tumoral alfa (TNF-α), as células NK (glóbulos brancos especializados no combate às células cancerígenas), entre outras. Para o aparecimento de um cancro presume-se que intervenham muitos fatores, alguns do próprio doente e outros externos. Dos factores externos, vários poderão estar relacionados com o estilo de vida stressante, da sobrecarga às nossas defesas naturais e de constante inflamação sistémica. É neste ponto que o exercício físico, quando bem individualizado a cada pessoa, é uma mais valia, sobretudo no que concerne ao treino de força (com carga externa ou peso corporal).
Foi, recentemente, descoberto que a contração muscular tem a capacidade de produzir citocinas (proteínas que têm uma ação semelhante às hormonas) que regulam a resposta à inflamação e outros eventos biológicos do nosso corpo. Durante um treino de força, o músculo liberta a Interleucina 6 (IL-6), que tem uma conhecida ação contra as células cancerígenas, potenciando a resposta natural da TNF-α. Ou seja, a contração do músculo pode ajudar o organismo a lutar de forma natural contra o cancro.
Outras interleucinas produzidas nas horas após o treino de força (IL-1, IL-10 e IL-15) podem ter um papel importante, também, na redução da inflamação sistémica e sobretudo visceral, fortificando assim as nossas defesas. Numa revisão bibliográfica longitudinal, publicada em Janeiro de 2018, foram verificadas melhorias significativas também na percepção da qualidade de vida dos pacientes oncológicos afetos à prática regular de exercício físico. Ou seja, não só a contração muscular ajuda no aumento das defesas imunitárias, como o treino também potencia uma mente mais forte!
Em suma, o exercício pode ajudar na prevenção, durante e, até mesmo, após o cancro. Duas a três sessões de treino por semana, com treino aeróbio condicionado e treino de força bem individualizado, podem ajudar o organismo a manter as capacidades funcionais, e ainda a fortalecer as defesas naturais do organismo. O exercício aumenta a força, resistência e, consequentemente, a qualidade de vida! Por isso, diria a todos os doentes vítimas de um cancro: sim, é possível melhorar e o exercício pode dar um importante contributo!
Referências:
1. Brasure, Michelle, et al. “Physical Activity Interventions in Preventing Cognitive Decline and Alzheimer-Type Dementia: A Systematic Review.” Annals of Internal Medicine, American College of Physicians, 2 Jan. 2018, annals.org/aim/article-abstract/2666417/physical-activity-interventions-preventing-cognitive-decline-alzheimer-type-dementia-systematic?doi=10.7326%2FM17-1528.
2. Gallo-Villegas, J, et al. “Efficacy of high-Intensity, low-Volume interval training compared to continuous aerobic training on insulin resistance, skeletal muscle structure and function in adults with metabolic syndrome: study protocol for a randomized controlled clinical trial (Intraining-MET).” Trials., U.S. National Library of Medicine, 27 Feb. 2018, www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29482601.
3. Polter, A M, et al. “Synaptic function and plasticity in identified inhibitory inputs onto VTA dopamine neurons.” The European journal of neuroscience., U.S. National Library of Medicine, www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29480954.
4. R Artal, and M O'Toole. “Guidelines of the American College of Obstetricians and Gynecologists for Exercise during Pregnancy and the Postpartum Period.” Br J Sports Med , 1 Feb. 2003, pp. 6–12.
5. Toohey, K, et al. “Does low volume high-Intensity interval training elicit superior benefits to continuous low to moderate-Intensity training in cancer survivors?” World journal of clinical oncology., U.S. National Library of Medicine, 10 Feb. 2018, www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29468132.
6. Clark, Micheal, et al. NASM Essentials of Sports Performance Training. Jones & Bartlett Learning, 2015.
7. “Physical activity for women with breast cancer after adjuvant therapy.” Wiley, John Wiley & Sons, Ltd, 29 Jan. 2018, onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/14651858.CD011292.pub2/abstract.
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