A dor crónica lombar é caracterizada por uma dor localizada na região inferior da coluna – entre a 12ª costela e a zona inferior dos glúteos – e pode ser bastante limitativa da qualidade de vida provocando elevados custos económicos [1] . Embora seja multifatorial, muitos acreditam que possa estar relacionada com um estilo de vida sedentário preconizado pelas exigências profissionais, porém parece assolar também pessoas com profissões de grande exigência física ou estacionárias. Logo, faz sentido inferir que o problema possa estar mais relacionado com a forma como os músculos contraem ao invés da posição corporal. Assim, a utilização de exercícios de extensão lombar isolada para o fortalecimento da musculatura extensora da coluna lombar (ex.: multifidus, longissimus, iliocostalis, quadratus lumborum) poderá ser uma boa estratégia de prevenção e reabilitação [2], independentemente da sintomatologia dolorosa [3], sendo que 1 vez por semana, no caso da intensidade muscular ser alta [4], ou com maior frequência em intensidades menos elevadas, poderá ser suficiente para a diminuição e prevenção da dor lombar.
O olhar da Medicina sobre nós
A comunidade médica reconhece o papel positivo do exercício físico nesta patologia sendo que considera que as alterações degenerativas “não são, nem devem ser, impeditivas de uma vida ativa” e que “é possível praticar desporto mesmo na presença dessas alterações” (in CUF, 2019). Estas alterações degenerativas nos tecidos moles poderão afetar ainda a massa óssea provocando lesões irreversíveis. Mas haverá algum movimento que aumente o risco de lesão?
Devido à morfologia anatómica das vértebras lombares, a posição de flexão máxima com rotação é aquela que acarreta um maior risco lesivo nos discos intervertebrais. Mas será apenas este movimento que pode colocar em causa a integridade da coluna lombar?
Possíveis Causas
Hoje sabemos que a cirurgia à coluna provoca uma diminuição de estímulo eferente na musculatura extensora lombar, o que pode desenvolver uma perda de massa muscular, e potencialmente perda de força [5]. Os indivíduos submetidos a este tipo de cirurgia apresentam níveis de força máxima isométrica inferiores, sejam eles sintomáticos ou não, que podem ser resultado de fatores como: inibição neural, perda de massa muscular, adoção de comportamentos preventivos de dor ou pouca motivação intrínseca para o exercício.
Numa revisão bibliográfica [6] a 107 artigos científicos envolvendo cerca de 20.000 indivíduos manifesta-se a sustentação científica para que a perda de capacidade contrátil nos músculos extensores da coluna lombar seja considerado um fator importante no desenvolvimento da dor. No entanto, confortavelmente crentes em paralogismos, muitos de nós continuamos a acreditar que a “má postura” - seja lá o que isso for - provoca a lesão. Porém, não será plausível que a falta de força, essa sim, provoque uma “má postura”?
Terapias mais comuns
Geralmente, e pelo senso comum, os indivíduos que sofrem de dor lombar são aconselhados a fazer exercício de “baixa intensidade”, tal como: Pilates, Alongamentos, e até mesmo andar a pé (sobre este último, peço perdão ao leitor, mas vou poupar caracteres para algo mais relevante). Ora vejamos o que nos diz a ciência:
Pilates: é melhor do que o sedentarismo para a redução da dor, mas não é mais vantajoso do que outras modalidades de exercício [7,8,9,10]; não apresenta benefícios estatisticamente relevantes a nível clínico quando comparado com outras metodologias de fortalecimento muscular [11].
Alongamentos: não promovem aumento de mobilidade articular nem diminuição das contraturas em populações clínicas [12] ; independentemente da intensidade [13]; podendo ter implicações desvantajosas, até mesmo severas, no sistema nervoso [14] ; e que quando retirado dos protocolos de treino produz efeitos positivos nos praticantes [15].
Ou seja, na sua generalidade, o exercício faz bem, desde que haja contração muscular, e por isso fortalecimento dos músculos. No entanto, o exercício com resistências (trabalho de força, musculação) e o exercício no meio aquático – note-se, não necessariamente natação - parecem ser os mais eficazes no tratamento e prevenção da dor lombar [16]. Numa revisão de 2016 [17], após a análise de 16 estudos com 1351 indivíduos com excesso de peso/obesos e dor lombar, em que aplicaram diferentes tipos de exercício – aeróbico, resistências, aquático, yoga/pilates -, as conclusões foram as seguintes:
Treino c/ Resistências e Aquático tiveram melhor retenção, indicando que este tipo de exercício pode promover “maior impacto geral nos resultados positivos para pessoas com excesso de peso/obesas e dor lombar”.
O exercício cardiovascular poderá ser importante para perder peso, mas numa primeira fase o mais importante será diminuir a dor lombar através do aumento da capacidade contrátil lombar.
Treino com resistência externa: Uni-articular vs Multi-articular
“Os exercícios de extensão lombar isolada podem ser eficazes na prevenção e tratamento da lesão lombar”
(J. Fisher et al.,2012).
No que ao treino com resistências diz respeito, muitos treinadores recorrem a exercícios multi-articulares como o Romanian Deadlift, a fim de fortalecer a musculatura extensora da coluna. Porém, esta abordagem não parece ser mais vantajosa quando comparada com exercícios de extensão lombar isolados [18] . Pelo contrário, os exercícios de extensão lombar isolada parecem promover um aumento de força que depois é facilmente transferido para exercícios multi-articulares. Numa revisão a 88 artigos [19] verificou-se:
Exercício multi-articulares parecem fortalecer e ativar os extensores da coluna lombar;
Porém, os estudos longitudinais atribuem estas melhorias dos exercícios multi-articulares ao fortalecimento dos extensores da anca - isquiotibiais - e não tanto ao fortalecimento dos extensores lombares;
Os exercícios com restrição pélvica (ditos isolados), parecem ser mais eficazes no fortalecimento dos extensores lombares.
Devido à pouca amplitude de movimento disponível entre as vértebras desta região da coluna e a zona sacral, podemos considerá-la um todo, onde o eixo lateral-medial dos movimentos de flexão/extensão lombares possa estar situado algures entre L2-L4. A extensão lombar isolada poderá ser considerada como um exercício predominantemente uni articular, sendo que a literatura sugere que, no âmbito da ativação da musculatura extensora da coluna lombar, os exercícios uni-articulares possam ser mais eficazes [20]. Para tal, é determinante que a região pélvica esteja restringida por apoios externos ao organismo do indivíduo.
Carga e frequência
E o que nos diz a literatura em relação à carga e frequência de treino a utilizar? Ora, os exercícios de extensão lombar isolada podem produzir aumentos semelhantes de força, quer seja com cargas mais altas, ou mais baixas [21]. Sabemos que o fortalecimento da musculatura extensora lombar aumenta a força isométrica e a amplitude de movimento, diminuindo ainda a dor lombar [22], e que para isso basta UMA VEZ POR SEMANA [23]. O que contrasta com algumas recomendações da ACSM que preconiza maiores volumes.
Em suma, podemos concluir que esta patologia, tão frequente, pode ser prevenida e tratada através do fortalecimento da musculatura extensora da coluna lombar. Para tal, é aconselhável priorizar estes músculos com exercícios que restrinjam a região sacral e pélvica. Os mesmos poderão ser realizados como preparação – ou “aquecimento” se assim o leitor preferir – de forma isométrica (microdinâmica), por apenas uma série, uma vez por semana no caso da pessoa tolerar a falha muscular momentânea, ou mais vezes para uma progressão mais gradual.
© Afonso Franco, 2019
(Representante REP - Madeira)
Referências:
[1] Vogel,2009.
[2] Steele et al., 2018.
[3] Behennah,2018.
[4] Steele, 2014.
[5] Conway, 2018.
[6] Steele et al., 2014.
[7] Lim, 2011.
[8] Gaines, 2018.
[9] Miyamoto, 2013.
[10] Patti, 2015.
[11] Posadzki, 2011.
[12] Harvey, 2017.
[13] Apostolopoulos, 2015.
[14] Nordez et al., 2017.
[15] Nuzzo, 2019.
[16] Shi et al., 2018.
[17] Wasser et al., 2016.
[18] Fisher et al., 2013.
[19] Steele et al., 2013.
[20] Gentil et al., 2016.
[21] Fisher et al., 2018.
[22] Steele et al., 2015.
[23] Bruce-Low et al., 2012.
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