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Diabetes: Outra Pandemia!

Atualizado: 30 de jun. de 2020

A diabetes tipo 2 é uma doença metabólica caracterizada por um estado crónico de hiperglicémia, resultante da combinação entre a incapacidade das células responderem correctamente à insulina (resistência à insulina) e a falta de uma resposta compensatória adequada de secreção da mesma (função deficiente das células beta do pâncreas) e representa entre 90 a 95% dos diabéticos no mundo. Por sua vez, a diabetes tipo 1 caracteriza-se pela ausência total de secreção de insulina, geralmente provocada pela destruição autoimune das células beta do pâncreas. [1]


Insulina


A insulina é uma hormona produzida pelas células beta do pâncreas, responsável por regular e controlar o nível de glucose plasmática dentro dos valores fisiológicos normais. A sua síntese e libertação na corrente sanguínea são estimuladas pelo aumento da glucose no sangue e promovem a absorção da mesma, especialmente pelo tecido muscular. A insulina também inibine a produção e libertação de glucose pelo fígado e funciona como hormona anabólica que promove o crescimento celular e inibe processos catabólicos como a glicólise, a gluconeogénese, a lipólise e a proteólise. [2]

Impacto mundial


Em 2015 existiam 415 milhões de pessoas diagnosticadas com diabetes de entre as quais 90% dizem respeito ao tipo 2. A esse número somavam-se mais 318 milhões de pessoas em estado de pré-diabetes. Até 2040 projecta-se que o número evolua para 642 milhões de diabéticos no mundo. [3]


De acordo com o relatório do programa nacional para a diabetes de 2019 [4], Portugal é um dos países da União Europeia com maior percentagem de diabéticos, englobando um total de 3 milhões de Portugueses com diabetes ou pré-diabetes, o que representa 40% da população portuguesa. Todos os dias são diagnosticados cerca de 200 novos casos de diabetes em Portugal.


A diabetes é, atualmente, considerada a epidemia do século [5].


Complicações crónicas


Segundo os dados do Eurostat [6], em 2016, a diabetes representa a 8ª maior causa de morte na Europa. No entanto, esta doença está altamente representada nas primeira e segunda causas de morte, que são as doenças cardíacas isquémicas e as doenças cerebrovasculares, respectivamente, cuja probabilidade de se desenvolverem quadruplica em indivíduos diabéticos e antecipa-se em 15 anos de idade relativamente a não diabéticos. De facto, a doença cardiovascular e AVC são responsáveis por 65% da mortalidade em diabéticos [7]. Outros problemas graves de saúde associados à diabetes são a hipertensão, dislipidémia, hiperandrogenismo e adrenarca precoce, esteatose hepática e inflamação sistémica [5], nefropatia (insuficiência renal), neuropatia (pé diabético e amputações) e retinopatia (cegueira). A retinopatia diabética é a maior causa de cegueira entre adultos dos 20 aos 74 anos nos EUA e faz com que entre 33 a 66 pessoas percam a visão todos os dias. Por sua vez, no mesmo país, a diabetes é responsável por 128 novos casos de insuficiência renal em fase terminal todos os dias. [8]


Classificação e diagnóstico


De acordo com a Associação Americana de Diabetes [1], considera-se diabético quem apresente um dos seguintes valores: 1) ≥6.5% A1C (hemoglobina glicada); 2) ≥126mg/dl (7mmol/l) glucose plasmática em jejum; 3) ≥200mg/dl (11.1 mmol/l) de glucose plasmática após 2h ao teste de tolerância utilizando 75g de glucose por via oral; 4) sintomas clássicos de hiperglicémia como poliúria, polidipsia e perda de peso suspeita ou crise hiperglicémica aleatória com valores de glucose plasmática acima de 200mg/l. Considera-se pré-diabético quem tenha: 1) valores de hemoglobina glicada entre 5.7-6.4%; 2) glucose plasmática em jejum entre 100-125mg/dl; 3) que responda ao teste de tolerância com valores entre 140-199mg/dl de glucose plasmática no período de duas horas após a aplicação do mesmo.


Benefícios do exercício físico na diabetes tipo 2


A literatura científica que explica os benefícios do exercício físico na diabetes é extensa e inequívoca [1,8,9], mas o presente artigo não se propõe a explicar nem desenvolver sobre os processos bioquímicos nele envolvidos, apenas despertar consciência sobre a dimensão desta epidemia e sobre o papel primordial que o exercício físico pode desempenhar na prevenção e tratamento da mesma, ou não fosse o baixo nível de condição física por si só, na verdade, um factor de risco de morte em indivíduos com diabetes tipo 2 [10] e que associado ao mesmo surge a obesidade, que representa um factor de risco para a diabetes, estado do qual 55% dos diabéticos padecem.


Sendo a diabetes um problema essencialmente relacionado com o metabolismo da glucose pela via da insulina, o exercício físico assume um papel preponderante na terapia e prevenção para diabetes tipo 2 e pré-diabetes, uma vez que fornece às células musculares um mecanismo alternativo ao da insulina para a absorção da glucose, fazendo com que indivíduos com resistência à insulina e/ou absência da mesma consigam, ainda assim, metabolizar a glucose e prevenir a hiperglicémia.


Evidências científicas [11] demostram que flutuações na glucose pós-prandial correlacionam-se melhor com as morbilidades micro e macrovasculares (já referidas neste artigo) e com a mortalidade cardiovascular do que a hemoglobina glicada ou a glucose em jejum, uma vez que estas não são representativas daquilo que ocorre após as refeições e durante o decorrer aleatório de um dia. Nesse sentido, o exercício físico assume papel preponderante uma vez que, ao contrário da medicação, que geralmente apresenta resultados modestos no que à melhoria da glucose pós-prandial diz respeito, o exercício físico tem-se provado efectivo em reduzir excursões glicémicas pós-prandiais [11] e os benefícios na absorção da glucose permanecem activos durante várias horas para além do término da actividade física [1]. Para além disso, o exercício também promove a sensibilidade à insulina [9,12], portanto, configurando-se como processo terapêutico e preventivo válido para esta doença [1] por actuar não só sobre os sintomas (hiperglicemia) mas também sobre uma das causas (resistência à insulina). Este aumento da sensibilidade à insulina contribui para a diminuição da hiperinsulinémia e consequente aumento da absorção de glucose. Este facto é relevante uma vez que a hiperinsulinémia é um factor de risco para a ateroesclerose e hipertensão. [8]


De facto, estudos demonstram que o exercício físico, em conjunto com dieta, é mais eficaz a reduzir o risco de diabetes em indivíduos com pré-diabetes do que a metformina. [3]


Quanto ao tipo de exercício mais adequado para obter benefícios relacionados com a diabetes, uma meta-análise [13] concluiu que exercício físico estruturado, incluindo a combinação de exercício aeróbio com exercício com resistência, promove a redução da percentagem de hemoglobina glicada em indivíduos com diabetes tipo 2. O mesmo estudo concluiu ainda que os melhores resultados são obtidos através de aconselhamento profissional, desde que o aconselhamento inclua exercício físico e dieta. Outra meta-análise [14] concluiu que mais do que escolher qual tipo de exercício físico realizar, o importante é garantir a prática de alguma actividade física independentemente do tipo, uma vez que as diferenças de resultados entre treino com resistências ou exercício aeróbio, no que diz respeito aos marcadores de risco cardiovascular e controlo da glucose, são pouco significativas. Também Harmer e col. (2014) na sua revisão sistemática, reuniram evidências que parecem apontar que para optimizar a diminuição da hemoglobina glicada é mais importante o volume e frequência de exercício semanal do que o tipo e intensidade do mesmo. Segundo Umpierre e col. (2011) os melhores resultados são conseguidos a partir de 150 minutos de exercício físico por semana.


Compêndio


A diabetes é uma epidemia mundial bem presente na sociedade moderna, com consequências graves para a saúde e qualidade de vida. O exercício físico pode evitar o desenvolvimento da diabetes em indivíduos saudáveis e ajudar a regredir a doença e evitar as morbilidades consequentes da mesma em indivíduos diabéticos tipo 2. Idealmente, o exercício físico deve combinar treino com resistências e treino aeróbio, deve ultrapassar os 150 minutos por semana (isto é, um mínimo de 6 sessões semanais de 30 minutos, ou 3 de 60 minutos) e deve ser levado em consideração que a frequência semanal de treino é mais importante do que a intensidade do mesmo. Os resultados do exercício físico em relação à doença da diabetes tipo 2 são optimizados quando existe acompanhamento profissional quer a nível do exercício físico quer ao nível da dieta.


© Carlos Eduardo Pinto, 2020

(Direitos de autor protegidos)


Referências:


[1] Colberg et al., 2010

[2] Arnold et al., 2018

[3] Chatterjee et al., 2017

[5] Kharroubi et al., 2015

[7] Campbell, 2009

[8] Pederson & Saltin., 2015

[9] Holten et al., 2004

[10] Myers et al., 2002

[11] Kearney & Thyfault, 2015

[12] Borghouts & Keizer, 2000

[13] Umpierre et al., 2011

[14] Yang et al., 2014

[15] Harmer et al., 2014

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